Receita autoriza crédito de PIS/Cofins sobre frete
Por: Luiza Calegari
Fonte: Valor Econômico
A Receita Federal autoriza o aproveitamento de créditos de PIS e Cofins
sobre frete contratado para o transporte de insumos vendidos com alíquota
zero. O entendimento consta na Solução de Consulta nº 90 da Coordenação-
Geral de Tributação (Cosit), que orienta a fiscalização do país.
A solução de consulta marca uma mudança de interpretação da Receita Federal
a respeito do assunto. Segue a jurisprudência consolidada do Conselho
Administrativo de Recursos Fiscais (Carf).
Segundo o texto, os valores de frete e seguro “são considerados serviços
utilizados como insumos à produção ou à prestação de serviços”. Dessa forma,
diz a Cosit, dão direito ao crédito das contribuições sociais.
O Carf já compreendia assim o assunto, desde junho de 2024, quando a 3ª
Turma do Conselho Superior aprovou a Súmula nº 188. Ela afirma que “é
permitido o aproveitamento de créditos sobre as despesas com serviços de
fretes na aquisição de insumos não onerados pela contribuição para o
PIS/Pasep e pela Cofins não cumulativas”, desde que o serviço tenha sido
tributado.
Os três acórdãos tomados como paradigmas para a edição da súmula são de
autuações direcionadas a empresas do agronegócio, que deve ser o setor mais
beneficiado pelo entendimento, por ter muitos insumos desonerados, segundo
Guilherme Saraiva Grava, do Diamantino Advogados Associados. Mas todo o
setor produtivo, acrescenta, pode se beneficiar.
No cerne das discussões está o artigo 3º, parágrafo 2º, inciso II, da Lei nº
10.833/2003 e a Lei nº 10.637/2003. O dispositivo estabelece que bens ou
serviços não sujeitos ao pagamento das contribuições sociais não dão direito a
créditos de PIS e Cofins.
A Receita, historicamente, afirmava que o regime jurídico do frete
acompanhava o do produto. Significava que, se a mercadoria tinha alíquota
zero, não era possível aproveitar o crédito do frete, mesmo que ele fosse
tributado.
A situação começou a mudar no ano de 2018, quando o Superior Tribunal de
Justiça (STJ) definiu, no Tema 779, que o insumo deve ser conceituado
conforme a essencialidade ou relevância de um determinado bem ou serviço
para a atividade econômica da empresa. Segundo Rodrigo Taraia, sócio do
BMA Advogados, esse entendimento abriu a possibilidade de o frete ser
considerado um elemento autônomo para fins de creditamento.
Foi exatamente essa a conclusão da 2ª Turma do Câmara Superior do Carf ao
julgar o recurso de uma cooperativa agroindustrial no ano de 2023 e assentar
que “o frete pago para o transporte de insumos não onerados pelo PIS e pela
Cofins é uma operação autônoma em relação à aquisição destes insumos”.
Portanto, segundo o colegiado, “os fretes para transporte de insumos que não
sofrem a tributação do PIS e da Cofins geram direito ao crédito de não
cumulatividade” (processo nº 10925.901060/2011-34).
A solução de consulta da Receita, para especialistas, traz mais segurança ao
tema, por “fechar o círculo” da jurisprudência que já vinha se consolidando.
“Não era bom a Receita, apesar de haver súmula do Carf, ter a possibilidade de
continuar autuando por não ter atualizado as normas. Com a uniformização do
entendimento, o contribuinte não corre mais risco”, diz Guilherme Grava.
Apesar dessa segurança, a norma trata apenas de um tipo específico de frete,
em um único momento da cadeia de produção, pontua Rodrigo Taraia. Outras
discussões permanecem em aberto, acrescenta, tanto no âmbito administrativo
quanto judicial.
Para o transporte entre estabelecimentos de produtos acabados ainda existe
controvérsia. O Carf tem posicionamento desfavorável ao contribuinte,
resumido na Súmula nº 217. O texto diz que “os gastos com fretes relativos ao
transporte de produtos acabados entre estabelecimentos da empresa não geram
créditos de contribuição para o PIS/Pasep e de Cofins não cumulativas”.
No caso dos produtos sujeitos ao regime monofásico (quando o tributo devido
em toda a cadeia é pago de uma vez por um dos entes responsáveis), por
exemplo, o STJ firmou precedente no Tema 1093 que veda a constituição de
créditos de PIS e Cofins sobre componentes do custo de aquisição dos bens.
De acordo com Taraia, no entanto, ainda está aberta a discussão judicial para
os casos em que o frete é custeado pelo vendedor, uma vez que a tese do STJ
aborda o custo de “aquisição”, que é pago pelo comprador.
Por outro lado, apesar de a solução de consulta não abranger todas as
possibilidades de frete, a sinalização de que o transporte pode ser tratado como
elemento autônomo para o uso dos créditos é positiva e pode ser aplicada para
outros casos, afirma o advogado. “O entendimento acaba sendo importante
para essas outras discussões.”
Guilherme Grava lembra que essa disputa está com os dias contados, porque o
PIS e a Cofins não vão mais existir a partir do ano de 2027. Isso vai gerar uma
situação, segundo ele, em que os tributos não serão mais cobrados, mas ainda
vai haver extensa discussão judicial a respeito deles.
Procurada pelo Valor, a Receita Federal não deu retorno até o fechamento da
edição.